4 de dezembro de 2011

Ansiedade

Gostava de segurar nos próprios cabelos
e de falar alto como se nada no mundo pudesse ouvi-la
Compartilhava a ansiedade de que um novo dia nasceria e de que a noite clarearia o mais rápido possível Sentia um enorme medo de perder os amigos por conta dos seus erros efêmeros e desmedidos
Amava as cores que tomavam intensidade a medida que o sol nascia
Tinha medo de escrever e parecer muito consigo mesma Tinha dó das pessoas que não encontravam um lugar confortável na vida Queria ajudar os amigos e ser livre nos continentes e nos transportes Queria finalizar o que andava escorrendo pela impaciência das conclusões humanas Achava que era menos humana porque se sentia culpada e não entendia o motivo
Queria um banho de mar um banho de mangueira
um banho de rio uma cascata caindo sobre sua cabeça
Era incolor para a maioria dos transeuntes Era implícita Irritantemente introspectiva Adorava sorri quando não sabia como agir Tagarelava no ouvido de quem mais amava pra poder aliviar as tensões internas E quando menos percebia sentia estar encontrando os mesmos erros e os mesmos atos Como se nada mudasse Como se nada implorasse pelo novo Como se tudo fosse repetitivo propositadamente
E era tudo de propósito mesmo
As árvores caiam mais rápidos propositalmente As pombas se reproduziam mais rápido propositalmente Os rios iam ficando sujos propositalmente Os cabelos embolavam de propósito só pra doer mais na hora de pentear E os dedos tremiam quando ela olhava pro espelho e o pente agarrava ainda a poucos centímetros da cabeça Os olhos enchiam de lágrimas e ela fingia não estar percebendo isso continuava puxando como se não houvesse direção mais certa do que o solo Arrancou todos os fios com o próprio pente sem diminuir a velocidade sem piscar os olhos
E a pia enchia de dores de medos de desejos
de vontades de corridas pneumáticas de apnéias chinesas e coreanas havia também um pouco dos pistaches do Irã e uma dúzia de mulheres e suas burcas Dentro da pia de onde se via algum antídoto escorrer dos olhos era madrugada era raciocínio tático - O que deixar de fazer para não perder o que se deve fazer de verdade ?

21 de novembro de 2011

Limpa

Concordo
As palavras andam escorregadias
passaram sabonete na intenção
de limpar as línguas.
Para que o povo se acostumasse
ao gosto azedo do detergente
Para uma limpeza urgente
Eles tentam disfarçar a cara
das nossas necessidades,
passam álcool em cada quina,
no vale das letras deixaram
acumular um pouco de desinfetante.

E a gente toda se engasga,

pouco a pouco,
a voz maior se estraga.

16 de novembro de 2011

o menino

Barulho, caos, orgulho
É tanto murmúrio, e ele nem espanta
É tanta euforia em volta e ele canta e canta
A moçada achou que ele tocava lento
no laço dos corpos ele acalmou sussurrou
nas cordas, num toque que culminou
no fim dos tempos.
Era um bando de jovens
aturdidos pelo moço-dinheiro
que mandava em tudo,
eles cantavam com o garoto
mas eram um pouco surdos.

O barulho todo se reverteu pra fora
quando cantaram através da memória.
As palavras misturadas que ele oferecia
Ele não sofria (mas eu sofri tanto)
Ele não sofria, ele só fazia cada nota
como quem assopra pra dentro de si
abrindo as portas que existiam
na conciência das cervejas de garrafa
no pensamento das vodkas do bar
na gentileza das cachaças sensatas.

Ele só queria rir pra praça
Adimirar a chuva, a noite, as garças.


(eu sofria tanto)

para o menino cícero.



14 de novembro de 2011

É pelo Grito

Pelo grito, derrubo alguns dilemas sobre o chão e abraço a causa de inúmeras nações. Opto por ver o riso dinamite das crianças enquanto cantam, ao invés dos títulos, dos apegos materiais e do ócio entorpecente das festa. Por esse grito que choro horrores ao ver o bem-te-vi no parapeito da minha janela, porque não é todo dia que ele resolve repousar ali, e não é todo dia que estou ali olhando pra fora. Repito, re-escrevo e amasso as folhas virtuais de letras que só piscam na tela pela eletrônica dos leds e cristais líquidos da tecnologia. É pelo grito que eu gemia ao ver a tua mão tocar a minha pele sem que houvesse amor antes do beijo. É no grito que o desejo é carne. E que a fúria é sangue. É na adrenalina que sobe e anestesia as preocupações e as dores do corpo. Porque é com o grito que ouço mais, e tateio mais, e as cores supersaturam na retina dos acontecimentos. É por ele que as idéias adormecem no assoalho da alma, a espera do momento inusitado e fértil de realizar os inúmeros planos.

5 de novembro de 2011

Chuviscos



A chuva.
Que tanto que é suspensa,
e úmida sob nossas narinas,
tanto que é ar e que agita
cogita e logo logo apita.
A chuva é mágoa de ar,
fazendo pirraça até virar nuvem.
E logo cansa de ficar pra lá e pra cá
até gritar pelo além, caindo sobre um mar
de possibilidades.
Árvores
cabeças
desigualdades
A chuva cai pra todo mundo.
A chuva é dessas que não escolhe o alvo,
só acerta e molha sendo fina, grossa ou algo
que só torna os egos um pouco mais calmos.


10 de setembro de 2011

se debatendo

Dormir pouco, catar o ânimo perdido lá no sonho inofensivo. Abrir os olhos, calar os impulsos e as depressões, deslizar sobre as maçãs do rosto para enfeitiçar a vida, convencendo-a de nossa necessidade súbita de cumprir certos horários, muitos afazeres. O relógio aguça a vontade que temos de lançar o alarme do despertador para o alto, e fazer dele nossa voz. A voz surda que esquece dos outros e só lembra das próprias necessidades. O grito rouco que acelera o coração dos mendigos depois que bebem e sorriem. Realmente Felizes! Realmente risonhos. O que a escória quer é entorpecentes. O que as crianças mortas querem é leite, água branca e concreta que a mãe não consegue produzir. Talvez, nossa verdadeira necessidade seja que todos os seres humanos fossem nós mesmos, triplicados, quadruplicados, infinitetizados talvez. Para que não houvesse motivos e explicações para se debater. E assim seríamos exércitos padronizados, desfilando pelas terras. Matando quem diverge, quem se empolga demais e quem definha muito. E é isso o que acontece, são muito poucos os que se parecem e se unem. Não há lugar para os muitos, e os poucos que ocupam tudo não sobreviveriam sem os muitos que se espremem nos quartinhos úmidos. Pra que ocupar tanto espaço, por que nunca é suficiente. Sinceramente, ainda vomito alguns pedaços de nojo. Nojo de tudo. Embora na maioria das vezes algum dejeto amarelo do exôfago olhe pra mim e sorrindo diz que é hora de desembarcar de si, e agir pro lado de fora.

3 de julho de 2011

Pelados

As linhas de todas as calças descosturaram, estão todos nus. Mostram em pele e em cor suas partes feias e desconfiguradas. Revelam seus desejos omitidos pelo pano púdico das roupas. Os padres logo abraçam as freiras, e as freiras umidecem rapidamente e beijam loucamente os padres. As viúvas de luto longíncuo pularam para as casa de seus respectivos vizinhos gordos e ociosamente imprestáveis, que logo as abraçaram fervorosos. Nos supermecados as mulheres lambusam-se de ketchup enquanto os homens jogam as carnes de boi pelo corredor e saltam sobre ela. Espirra sangue da carne enquanto eles vibram. Todos os adultos urram! Todos eles urram, eles correm, se destrambelham numa impolgação ilimitada. As crianças, na ausência de seus pais, brincam. Sua nudez pouco lhes importa. As brincadeiras só ficaram mais livres e duradouras, e noite eles dormem na praia todos sujos de terra. O dia seguinte é longo, a fome é trapaceada com algumas buscas na geladeira. A casa está uma bagunça, mas eles gargalham enormes, gigantes. Dois dias se passam. Todos os adultos morreram. As crianças crescem, aprendem o mundo sem repressões sexuais, sem desejos impedidos, às vezes alguns problemas, mas de qualquer forma a sociedade renasce. E só foi preciso abaixar as calças.


12 de junho de 2011

é pelo descaminho

Já não me preenche mais o caminhar vermelho das esquinas, as chuva fina é vazia... e as horas perdidas de sono não passam de um escorrer resmungado. Daqui do terceiro andar, vejo o lixo que eles jogam na rua acumular nas bocas dos bueiros, a água não desce, e a rua fica tão alagada como meu próprio cansaço. E aí... depois que os olhos pesam e o sono vem, os sonhos me mostram um além invisível ao olhar dos acordados. Um paralelo que se faz toda vez que alguém sonha, ou que alguém viaja nas imagens de suas fantasias. A lona cobre meus últimos pensamentos, mas meus pensamentos antigos já ficaram expostos ao Sol há muito tempo, estão tão quebradiços quanto os meus cabelos, e não controlo muito bem o fluxo das palavras quanto antes. Talvez melhor cair na armadilha dessa over-sinceridade, e destrambelhar antes que um onda arraste tudo, ou que a próxima enchente alcance os pés da minha cama.

O sentir que falta mais é o que me espanta, porque ao longo desse caminho as linhas do mapa embaçam e já não é mais permitido estar perdido. Os adultos precisam sempre saber pra onde estão indo, não é mesmo? E assim, se fingindo saber do futuro. Como videntes de nós mesmos. Vamos cultivando essa escuridão interna, sem se dar conta, que o buraco que cavamos para esconder a cabeça, já nos leva ao centro da Terra.

6 de junho de 2011

Rastrear

Me persigo sobre o balançar ligeiro da estrada, não consigo desacelerar a depressão que se instala. Meu ego cava a decoração que havia pelo interior, retira os brincos, as luvas, o salto, surra as calças, e mais do que tudo, me convence de esquecer as profundezas criativas do meu ser. Todavia, a medida que a hora passa, e não mais se enxergam os argumentos, no corpo circula sangue, o olhar se abre na única tarefa de estar, ali, inteiro, e mais nada. Ao circular dos excrementos expelidos pela alma lúcida e despretensiosa. Afogo-me no cálcio ingênuo, vou polir novamente o que arranhou nas asperezas da surra. Entro nas sub-rotinas da informação até exalar o cheiro que tem o chão pisado do centro da cidade. Excentricidade das nossas órbitas binárias, ainda há cores quentes na dança das estrelas frias, espectros de emissão entre as lânguidas asias do meu excessivo critério. Me cativo de ter cativeiros e sumo da luz de fundo que anisotropicamente alucinam os estudos desses físicos teóricos surdos. Acelero o tórax para despressurisar a busca, alivio a interna aflição com algum suor de bicicletas rápidas e pulo mais alto que uma pulga d’água para caber no enterro dos meu últimos dilemas. Para deixar de transformar desejos em problemas, e me sobrar deitada olhando para o universo, amolecer os dentes da vaidade. Escorregar sobre as dobras do espaço-tempo. Soprar um pensamento livre. E partir do lugar onde as confusões predominam, para habitar os nervos que se recombinam na leve busca de um sonho. Uma estrada. Muitos passos para se dar. Uma vida.

23 de maio de 2011

Comunicações

As instalações de arame não se puseram sobre o gramado de propósito, e os lenços que se materializavam a medida que a luz saía da lâmpada também não eram por acaso. Ali o tempo era mais lento porque não se via tudo no mesmo instante que acontecia, levava dois ou três minutos para eu poder ver seus gestos e vice versa. Desta forma, ou agíamos muito lentamente, ou nos apressávamos em dizer ao máximo tudo, sem nunca nos entender de fato. Como num relance inútil que o acaso lhe profere. E não é permitido gemer, reclamar ou enraivecer. Eu me esquivei das tuas mensagens, parti em direção a instalação, você não pôde ver o momento, mas eu senti exatamente a tomada de decisão partir de dentro do estômago e cair sobre as bordas da minha bacia. Macia era o que eu era. Sem ninguém em mim, estipulei que caminhos poderia percorrer por dentro, e pelo fêmur me subia um vento cortante. Pé ante pé. Corro porque corro. Os arames não se contorciam mas os véus inundam a minha vista agora embaçada. Tomada pelas cores de pele, como se todas as pessoas do mundo tivessem raspado suas peles e doado para mim. Dentro da ópera de arame, não era possível nem sentir fome, os músculos relaxaram todos sem hesitar, e as pernas flutuavam nítidas sob o meu pescoço, não se fazia qualquer esforço, somente a sensação plena de não necessitar de ti. E não ter ninguém em mim.

15 de maio de 2011

Parque das Imagens - Clipe

O que surgiu de uma experiência, que gerou uma foto, que gerou um conto, que gerou uma música, que gerou uma harmonia, um arranjo, e agora tem banda:



29 de abril de 2011

Afônico

Muda,
me usa para descaber no seu peso,
iluda a lembrança que te come os pêlos,
Ambivalência nos pólos da alma.

Inunda essa casa toda, chora
sobre o meu colo, de que vale teu solo
se não consegues destemer a solidão aflita.

Clareia o olhar, abre nossos cubos de tédio
seja apenas médio, nada acima nada abaixo,
conduza-se pelo mesmo penhasco
sem titubear as pernas.
Sem apertar o passo,
Mantendo a ilesa graça
O sorriso místico
e aqueles segredos inabitados.

Se teu amor me vale,
acredito ser o meu desleixo a causa
dessa enorme água brotando sob os pés da cama.
O teto que desprende
é a força do que não me engana,
Sólido desconforto
permeando as várzeas
dos encontros.
Afinal,
é este o ponto.


23 de abril de 2011

Equilíbrio

Delícia de fome, me conformo com os pedaços de comida, água e saliva. A boca digere, o esôfago digere, digere o estômago, enquanto meus pensamentos passeiam pelos arcos da lapa até a ponta mais sutil do Arpoador. Ali é onde o sol se empenha em brilhar e a terra em girar pela inércia gigante desse sistema. Comportada pelos deveres, no entanto vejo a busca latente cada vez mais eminente e viva, e os resultados piscam pela tela dos acontecimentos. Primeiro uma foto, depois, um beijo, um desejo, os líquidos ainda borbulham sob o externo e meus olhos arregalam. Açúcar, sal, cafeína, glicose, hormônio, agrotóxico. Fossa dos desejos a me alimentar, combustível dos triglicerídeos, desconserto natural. Assim que arregalo, os músculos atiçados querem esticar contorcer desintegrar sobre a ação de seus próprios ácidos. Dor. Remédio. Retorno a ponta da cama, e sentada escrevo, não mais reflito sobre o dia, sobre o que deixei de fazer, presumo o sentimento que ainda não me acendeu no bulbo do cérebro. Descanso pelo ócio que tanto me quer alçar. Inércia dos cabelos oleosos e quebradiços. No caco mais ligeiro de mim, me varro para chegar na pá da consciência, olho pra sua carinha de noiva e a beijo na testa. De novo um barulho do corpo um grito no ínfimo do físico mudo e ativo. Vomitei. Estou viva. Pronto, saiu. Agora sim. Volto para a corda bamba do tempo, e equilibro.

9 de abril de 2011

...criando bichos...

É mesmo esse som que soa do corpo o que matém firme a vontade de luta, de permanecimento em cada barreira que se salta, cada beijo que se assalta, pelo ilusionismo das conversas e do cotidiano nosso. Me banha o abrir-se, jogar-se da janela só pra sentir a gravidade das coisas. Me inunda esse constante acreditar, pois mesmo que a mentira prevaleça, ainda há algo de sincero através dos olhares tênues do palavreado humano. Minha boca abre e fecha sob a ação involuntária de entender, flashes de raciocíonio lógico a conduzir as futuras palavras dessa leve história. Não, eu não sou algo de pura sinceridade, nem a leveza de todos os tempos habita a minha solidez. Porém, o feto que se multiplica dentro do útero, é futuro de gente. É carniça de alma, é um banhar-se ligeiro pelos líquidos viscosos da mucosa. Fomos todos esse ser que se alimenta invariavelmente. Fomos todos um pouco dementes através dos instintos milimétricos da vida. Mas sem isso não existiríamos, não vivenciaríamos os inóbvios conflitos, mesmo sendo eles comuns e inexprimíveis. Ainda sobre o teto da casa, deito. Admiro a imensidão das estrelas, o gigante universo implorando pelo nosso sangue, nossa excêntrica disponibilidade. Assim, vou dispersando o que me aflinge, regenero os versos, titubeio uma nova prosa. Morro nas preguiças dos sonhos. Sim, sou o lodo das pedras, a água com larvas de mosca, sou a sujeira da calçada sorrindo para o próximo gari que me varrerá até os confins do imundo, me mostrando a realidade e os fatos. A possibilidade do incompreensível. De qualquer forma, é o detalhe inútil aquilo que matém visível o defeito que se quer esconder, como etiqueta de roupa falsificada. Como mulher mal amada. Ah, Esses sons que me elevam o peito, que satisfazem o corpo, me transformam nesse fulminante ser reflexivo. E, por fim, acabam.

22 de fevereiro de 2011

Genesis

Dancei com as luzes
e me fundi ao mundo
Pois a minha matéria
virou átomo
e meu interior
se tornou profundo.
Pelas impurezas da humanidade,
subverti o escuro dos olhos
manipulei a face perplexa
para que alguma atitude
despontasse pelas pontas
dos pés.
Por fim,
respirei as moléculas de vida
e por alguns segundos,
extasiada que estive,
conectei meus declives
e escoei
pelos caldos quentes das relações humanas.

30 de janeiro de 2011

O menino Sono

E outra vez bateram sinos que despejavam uma lua cheia de água pelos pés do menino que antes não, mas agora sim, se sentia presente no presente do mundo. O menino sono, após longos bocejos, sobe na cama e grita: “Pai!”, enquanto bate as pernas para cima e para baixo. Encanta quem o vê falar, assim tão displicente, a palavra mais mágica dentre todas as outras no ouvido de um homem. Despertou por dentro da criança a fala, e por isso, tudo que vê é gravado pela memorinha recém criada, cheia de espaços vazios prontos na intenção-infância de serem preenchidos; deste modo, ganharia o resto do mundo.

Uma luz sai de dentro dele, corta a ponta de sua cabeça, agita a fala, ele grita, mexe a língua até bater no dente. Daí (!), um pingo de consciência e inteligência cai sobre o seu nariz enquanto ele reage a ação de não mais ser pura imagem: animada, real, e objetiva. Agora ele tem voz para dizer sua opinião, aceitar com sim, contestar com não. A gota no nariz escorre, corre para a boca onde ele lambe degusta e aguça cada vez que chora. Chora de impaciência pelas palavras ausentes de prática. "Acalma-te filho."

Pena não lembrar desse momento, pior que nem uma lembrancinha de como me sentia. Nasci e não lembro, e se nos sonhos não recordamos o porquê de acabar ali. Também devo sonhar de olhos abertos

na consciência de um gigante,

tolo e fascinado por histórias de povos contraditórios

desconexos e intrinsecamente vibrantes.

Oscilo e navego no meio das dobras de seu cérebro.

Imagina (!) que o Rio de Janeiro é só uma grande imensa fantasia,

mas são tantos detalhes dentro de um só gigante! *Talvez por isso gigante!*

27 de janeiro de 2011

INN PULSOS

São os impulsos que escolhem habitar as frestas dos meus tecidos internos:

Como esponja seca me encharco na dança, das aflições, das ansiedades, das distâncias aproximadas pelas lentes abstratas dos pensamentos. Essas minhas pernas, no alcance de sua máxima abertura, levitam sob a condição de sustentar as oscilações da vontade. De cima, observo, e habito os movimentos sutis das pessoas enquanto conversam, desvendo o ser real que existe dentro delas até cansar e dormir com sede de entender o porquê da escolha feita pelos impulsos primeiros. Pois só nas frestas, a coreografia improvisada das moléculas encontra um jeito de engolir o todo de uma só vez.


Uma fagocitose dos alimentos mais concretos da vida:

Por isso, fervo através das vontades súbitas que me arrastam até o próximo passo, a próxima história, a necessidade de fazer o momento. Encontrando os espaços atravessados dos compassos do tempo, relembrando os intermináveis verbos das noites e dias que constantemente vivemos.


Alicerce construído pelas atitudes precisas das palavras:

Sei que inutilmente me dissolvo no milkshake dos outros olhares, e exponho esse meu inteiro máximo para que alguma chave nos cérebros girem, para que a catraca estale, para que minha alma suba até ferver sobre a pele. E continuo quente porque as palavras as bocas e os olhos estão aí para isso! Para se traduzir o que é feito, e falar o que for indispensável.

23 de janeiro de 2011

POESIA CORRUPTA

Te proponho esse gosto vazio de poesia

te emudeço para que ouças

se deixe ficar constrangido

e entregue a libido

embrulhada pelo meu presente.


Fixo-me instintivamente

golpeio a palavra, ela paira a tua frente

ziguezagueando e penetrando no rosto

fincando o acaso eloquente.

A poesia é sua,

a cada avanço do tempo mais ainda tua

um badalar isento de culpa

A poesia é sua,

corrupta, nua.

12 de janeiro de 2011

A menina Equilibrista

Estive pensando em desatar os rumos, como se o universo conspirasse para que algo acontecesse em determinado momento só porque ele quer, o universo. Então você brinca de ser, um universo, e distorce as coisas, como uma grande massa gravitacional desviando o caminho da luz. Uma fusão de galáxias que você pode moldar, controlar pelo after effects a progressão das imagens. Tornar viável os fluxos que passam por dentro até virar um grande pensamento controlado pelos seus pensamentos. Pode ser coisas que vem por causa deste momento, onde me sinto capaz de moldar as coisas, como por exemplo, o tempo.


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Há uma linha infinita, riscada a cada segundo por um ser de um mundo profundo. Em cada risco, ele anota o que acontece, breves descrições das sensações que passam pelo seu corpo, e logo, os segundos os dias se passam, esse breve senhor, se vê na desgraça de anotar sem cessar as lembranças das sensações vividas por uma moça, uma mocinha, pequena, baixinha, doidinha para ser alcançada no meio de um desencontro. Ela lê contos, ela chora com os filmes, ela transparece ser firme, e ao mesmo tempo estranha. É que a garganta da moça arranha toda vez que fala de coisas que passam pela sua alma, então ela decidiu ser calma e procurar um senhor que anotasse, anotasse tudo que passasse por baixo das roupas da moça. Brevemente as frases dele deixaram de ser discretas, para se tornarem contínuas como um livro que se escreve a medida que se passa a vida. Às vezes era prosa, às vezes era verso, uma simples conversa que desatasse um universo. Mas como ele era capaz de entender a moça, ia fluindo pelas nuânces de seus olhos ia querendo distinguir os atos falhos, e os válidos. E a moça foi, desde os 16 anos, tendo quem escrevesse seu livro e desvendasse seus planos. Caçou pelos mares das dores, as cores de um futuro promissor, e revelou ser garota encantada quando se falava das dores de amor. O senhor que muito muito escrevia entendia que podia florear aqueles sentimentos, mas não havia o que aumentar pois o que acontecia era forte por si só. Era tudo como um nó apertado, não dá pra ser afrouxado, nem cortado. O que acontecia não podia ser fantasiado. Seus dedos cansavam suavam com o lápis, a caneta, a pena de pavão que arranjara enquanto escrevia perto da casa de um outro ancião. Enquanto escrevia e conversava uma conversa afiada, encontrou no destino do outro seu próprio destino, que deixara correr em vão pela simples missão de ter que transcrever a garota de forte coração. Sentiu-se triste mas não podia sentir a si. Sentiu o vazio de ser amplamente preenchido por outro moinho. O moinho da menina amada que vivia floreada por si mesma. Quando encontrava um grande amor, logo seus pés deslizavam pela perna, logo suas canelas atiçavam de ansiedade: queria correr sobre o tempo! Sim! O tempo da linha onde o senhor escrevia! A menina, quando amava, sentia que andava sobre uma linha equilibrada, justa sob os seus pés, mas ela não ligava, queria mesmo seguir pra frente, ver onde aquilo ia dar, queria acelerar as coisas. A medida que o velho a transcrevia, percebia que os segundos muitas vezes passavam mais rápido, percebia que os músculos dos dedos não eram mais flácidos eram ágeis, imutáveis, tensos e leves pelo seu papel de elevar palavras ao céu. Um dia desses, era muito quente pelo Rio de Janeiro, como se desaguasse o mundo inteiro pelos poros da pele, até podia derreter como neve. A garota de vestido sabia que a qualquer momento poderia cair da linha, pois os amores andavam fracos, tristonhos até mesmo medonhos. Andava equilibrada, mas com muito medo, carregava na mão dois pesos de chumbo, às vezes gritava para sentir o bumbo do seu próprio coração. “Você está aí?”, gritava, e o velho não respondia, pois só o que conseguia era escrever o momento tão rico em argumentos, desalentos, descontentamentos, ventos. Os dedos se movimentavam quase na velocidade da luz, começava a aquecer, a iluminar, a gerar uma radiação amarela que nunca se pode copiar, mas ele escrevia atônito. Não queria parar. Preferia continuar. Era como goz... gostava muito disso tudo! Ângela caiu da linha, havia uma rede bem logo embaixo, rede de segurança, aquela que se faz quando se põe uma aliança. Ângela caiu balançou e sorriu. Aplaudiu o velho cansado que agora pela primeira vez descansava e gritava “É o fim do meu primeiro livro!” Ela caiu de alivio. Ela sussurrou se tinha feito tudo certinho. E ele a pegou pelos braços acanhado. Percebeu seus músculos do rosto que tanto havia reparado, agora poderia olhar sem anotar, só brilhar por dentro do olhos de velho escritor que nascia com quase noventa anos. A menina agora corria por outros planos, buscava outros velhos, outras dores de amor, ou quem sabe escrevê-las por si só. Seu Antônio percebeu ter alcançado seus objetivos, mas que agora tudo fazia mais sentido e talvez fosse a grande hora de voltar a florear suas dores e morrer. Morrer de amores.