29 de abril de 2011

Afônico

Muda,
me usa para descaber no seu peso,
iluda a lembrança que te come os pêlos,
Ambivalência nos pólos da alma.

Inunda essa casa toda, chora
sobre o meu colo, de que vale teu solo
se não consegues destemer a solidão aflita.

Clareia o olhar, abre nossos cubos de tédio
seja apenas médio, nada acima nada abaixo,
conduza-se pelo mesmo penhasco
sem titubear as pernas.
Sem apertar o passo,
Mantendo a ilesa graça
O sorriso místico
e aqueles segredos inabitados.

Se teu amor me vale,
acredito ser o meu desleixo a causa
dessa enorme água brotando sob os pés da cama.
O teto que desprende
é a força do que não me engana,
Sólido desconforto
permeando as várzeas
dos encontros.
Afinal,
é este o ponto.


23 de abril de 2011

Equilíbrio

Delícia de fome, me conformo com os pedaços de comida, água e saliva. A boca digere, o esôfago digere, digere o estômago, enquanto meus pensamentos passeiam pelos arcos da lapa até a ponta mais sutil do Arpoador. Ali é onde o sol se empenha em brilhar e a terra em girar pela inércia gigante desse sistema. Comportada pelos deveres, no entanto vejo a busca latente cada vez mais eminente e viva, e os resultados piscam pela tela dos acontecimentos. Primeiro uma foto, depois, um beijo, um desejo, os líquidos ainda borbulham sob o externo e meus olhos arregalam. Açúcar, sal, cafeína, glicose, hormônio, agrotóxico. Fossa dos desejos a me alimentar, combustível dos triglicerídeos, desconserto natural. Assim que arregalo, os músculos atiçados querem esticar contorcer desintegrar sobre a ação de seus próprios ácidos. Dor. Remédio. Retorno a ponta da cama, e sentada escrevo, não mais reflito sobre o dia, sobre o que deixei de fazer, presumo o sentimento que ainda não me acendeu no bulbo do cérebro. Descanso pelo ócio que tanto me quer alçar. Inércia dos cabelos oleosos e quebradiços. No caco mais ligeiro de mim, me varro para chegar na pá da consciência, olho pra sua carinha de noiva e a beijo na testa. De novo um barulho do corpo um grito no ínfimo do físico mudo e ativo. Vomitei. Estou viva. Pronto, saiu. Agora sim. Volto para a corda bamba do tempo, e equilibro.

9 de abril de 2011

...criando bichos...

É mesmo esse som que soa do corpo o que matém firme a vontade de luta, de permanecimento em cada barreira que se salta, cada beijo que se assalta, pelo ilusionismo das conversas e do cotidiano nosso. Me banha o abrir-se, jogar-se da janela só pra sentir a gravidade das coisas. Me inunda esse constante acreditar, pois mesmo que a mentira prevaleça, ainda há algo de sincero através dos olhares tênues do palavreado humano. Minha boca abre e fecha sob a ação involuntária de entender, flashes de raciocíonio lógico a conduzir as futuras palavras dessa leve história. Não, eu não sou algo de pura sinceridade, nem a leveza de todos os tempos habita a minha solidez. Porém, o feto que se multiplica dentro do útero, é futuro de gente. É carniça de alma, é um banhar-se ligeiro pelos líquidos viscosos da mucosa. Fomos todos esse ser que se alimenta invariavelmente. Fomos todos um pouco dementes através dos instintos milimétricos da vida. Mas sem isso não existiríamos, não vivenciaríamos os inóbvios conflitos, mesmo sendo eles comuns e inexprimíveis. Ainda sobre o teto da casa, deito. Admiro a imensidão das estrelas, o gigante universo implorando pelo nosso sangue, nossa excêntrica disponibilidade. Assim, vou dispersando o que me aflinge, regenero os versos, titubeio uma nova prosa. Morro nas preguiças dos sonhos. Sim, sou o lodo das pedras, a água com larvas de mosca, sou a sujeira da calçada sorrindo para o próximo gari que me varrerá até os confins do imundo, me mostrando a realidade e os fatos. A possibilidade do incompreensível. De qualquer forma, é o detalhe inútil aquilo que matém visível o defeito que se quer esconder, como etiqueta de roupa falsificada. Como mulher mal amada. Ah, Esses sons que me elevam o peito, que satisfazem o corpo, me transformam nesse fulminante ser reflexivo. E, por fim, acabam.