e de falar alto como se nada no mundo pudesse ouvi-la
um banho de rio uma cascata caindo sobre sua cabeça
Me persigo sobre o balançar ligeiro da estrada, não consigo desacelerar a depressão que se instala. Meu ego cava a decoração que havia pelo interior, retira os brincos, as luvas, o salto, surra as calças, e mais do que tudo, me convence de esquecer as profundezas criativas do meu ser. Todavia, a medida que a hora passa, e não mais se enxergam os argumentos, no corpo circula sangue, o olhar se abre na única tarefa de estar, ali, inteiro, e mais nada. Ao circular dos excrementos expelidos pela alma lúcida e despretensiosa. Afogo-me no cálcio ingênuo, vou polir novamente o que arranhou nas asperezas da surra. Entro nas sub-rotinas da informação até exalar o cheiro que tem o chão pisado do centro da cidade. Excentricidade das nossas órbitas binárias, ainda há cores quentes na dança das estrelas frias, espectros de emissão entre as lânguidas asias do meu excessivo critério. Me cativo de ter cativeiros e sumo da luz de fundo que anisotropicamente alucinam os estudos desses físicos teóricos surdos. Acelero o tórax para despressurisar a busca, alivio a interna aflição com algum suor de bicicletas rápidas e pulo mais alto que uma pulga d’água para caber no enterro dos meu últimos dilemas. Para deixar de transformar desejos em problemas, e me sobrar deitada olhando para o universo, amolecer os dentes da vaidade. Escorregar sobre as dobras do espaço-tempo. Soprar um pensamento livre. E partir do lugar onde as confusões predominam, para habitar os nervos que se recombinam na leve busca de um sonho. Uma estrada. Muitos passos para se dar. Uma vida.
E outra vez bateram sinos que despejavam uma lua cheia de água pelos pés do menino que antes não, mas agora sim, se sentia presente no presente do mundo. O menino sono, após longos bocejos, sobe na cama e grita: “Pai!”, enquanto bate as pernas para cima e para baixo. Encanta quem o vê falar, assim tão displicente, a palavra mais mágica dentre todas as outras no ouvido de um homem. Despertou por dentro da criança a fala, e por isso, tudo que vê é gravado pela memorinha recém criada, cheia de espaços vazios prontos na intenção-infância de serem preenchidos; deste modo, ganharia o resto do mundo.
Uma luz sai de dentro dele, corta a ponta de sua cabeça, agita a fala, ele grita, mexe a língua até bater no dente. Daí (!), um pingo de consciência e inteligência cai sobre o seu nariz enquanto ele reage a ação de não mais ser pura imagem: animada, real, e objetiva. Agora ele tem voz para dizer sua opinião, aceitar com sim, contestar com não. A gota no nariz escorre, corre para a boca onde ele lambe degusta e aguça cada vez que chora. Chora de impaciência pelas palavras ausentes de prática. "Acalma-te filho."
Pena não lembrar desse momento, pior que nem uma lembrancinha de como me sentia. Nasci e não lembro, e se nos sonhos não recordamos o porquê de acabar ali. Também devo sonhar de olhos abertos
na consciência de um gigante,
tolo e fascinado por histórias de povos contraditórios
desconexos e intrinsecamente vibrantes.
Oscilo e navego no meio das dobras de seu cérebro.
Imagina (!) que o Rio de Janeiro é só uma grande imensa fantasia,
mas são tantos detalhes dentro de um só gigante! *Talvez por isso gigante!*
São os impulsos que escolhem habitar as frestas dos meus tecidos internos:
Como esponja seca me encharco na dança, das aflições, das ansiedades, das distâncias aproximadas pelas lentes abstratas dos pensamentos. Essas minhas pernas, no alcance de sua máxima abertura, levitam sob a condição de sustentar as oscilações da vontade. De cima, observo, e habito os movimentos sutis das pessoas enquanto conversam, desvendo o ser real que existe dentro delas até cansar e dormir com sede de entender o porquê da escolha feita pelos impulsos primeiros. Pois só nas frestas, a coreografia improvisada das moléculas encontra um jeito de engolir o todo de uma só vez.
Uma fagocitose dos alimentos mais concretos da vida:
Por isso, fervo através das vontades súbitas que me arrastam até o próximo passo, a próxima história, a necessidade de fazer o momento. Encontrando os espaços atravessados dos compassos do tempo, relembrando os intermináveis verbos das noites e dias que constantemente vivemos.
Alicerce construído pelas atitudes precisas das palavras:
Sei que inutilmente me dissolvo no milkshake dos outros olhares, e exponho esse meu inteiro máximo para que alguma chave nos cérebros girem, para que a catraca estale, para que minha alma suba até ferver sobre a pele. E continuo quente porque as palavras as bocas e os olhos estão aí para isso! Para se traduzir o que é feito, e falar o que for indispensável.
Te proponho esse gosto vazio de poesia
te emudeço para que ouças
se deixe ficar constrangido
e entregue a libido
embrulhada pelo meu presente.
Fixo-me instintivamente
golpeio a palavra, ela paira a tua frente
ziguezagueando e penetrando no rosto
fincando o acaso eloquente.
A poesia é sua,
a cada avanço do tempo mais ainda tua
um badalar isento de culpa
A poesia é sua,
corrupta, nua.
Estive pensando em desatar os rumos, como se o universo conspirasse para que algo acontecesse em determinado momento só porque ele quer, o universo. Então você brinca de ser, um universo, e distorce as coisas, como uma grande massa gravitacional desviando o caminho da luz. Uma fusão de galáxias que você pode moldar, controlar pelo after effects a progressão das imagens. Tornar viável os fluxos que passam por dentro até virar um grande pensamento controlado pelos seus pensamentos. Pode ser coisas que vem por causa deste momento, onde me sinto capaz de moldar as coisas, como por exemplo, o tempo.
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Há uma linha infinita, riscada a cada segundo por um ser de um mundo profundo. Em cada risco, ele anota o que acontece, breves descrições das sensações que passam pelo seu corpo, e logo, os segundos os dias se passam, esse breve senhor, se vê na desgraça de anotar sem cessar as lembranças das sensações vividas por uma moça, uma mocinha, pequena, baixinha, doidinha para ser alcançada no meio de um desencontro. Ela lê contos, ela chora com os filmes, ela transparece ser firme, e ao mesmo tempo estranha. É que a garganta da moça arranha toda vez que fala de coisas que passam pela sua alma, então ela decidiu ser calma e procurar um senhor que anotasse, anotasse tudo que passasse por baixo das roupas da moça. Brevemente as frases dele deixaram de ser discretas, para se tornarem contínuas como um livro que se escreve a medida que se passa a vida. Às vezes era prosa, às vezes era verso, uma simples conversa que desatasse um universo. Mas como ele era capaz de entender a moça, ia fluindo pelas nuânces de seus olhos ia querendo distinguir os atos falhos, e os válidos. E a moça foi, desde os 16 anos, tendo quem escrevesse seu livro e desvendasse seus planos. Caçou pelos mares das dores, as cores de um futuro promissor, e revelou ser garota encantada quando se falava das dores de amor. O senhor que muito muito escrevia entendia que podia florear aqueles sentimentos, mas não havia o que aumentar pois o que acontecia era forte por si só. Era tudo como um nó apertado, não dá pra ser afrouxado, nem cortado. O que acontecia não podia ser fantasiado. Seus dedos cansavam suavam com o lápis, a caneta, a pena de pavão que arranjara enquanto escrevia perto da casa de um outro ancião. Enquanto escrevia e conversava uma conversa afiada, encontrou no destino do outro seu próprio destino, que deixara correr em vão pela simples missão de ter que transcrever a garota de forte coração. Sentiu-se triste mas não podia sentir a si. Sentiu o vazio de ser amplamente preenchido por outro moinho. O moinho da menina amada que vivia floreada por si mesma. Quando encontrava um grande amor, logo seus pés deslizavam pela perna, logo suas canelas atiçavam de ansiedade: queria correr sobre o tempo! Sim! O tempo da linha onde o senhor escrevia! A menina, quando amava, sentia que andava sobre uma linha equilibrada, justa sob os seus pés, mas ela não ligava, queria mesmo seguir pra frente, ver onde aquilo ia dar, queria acelerar as coisas. A medida que o velho a transcrevia, percebia que os segundos muitas vezes passavam mais rápido, percebia que os músculos dos dedos não eram mais flácidos eram ágeis, imutáveis, tensos e leves pelo seu papel de elevar palavras ao céu. Um dia desses, era muito quente pelo Rio de Janeiro, como se desaguasse o mundo inteiro pelos poros da pele, até podia derreter como neve. A garota de vestido sabia que a qualquer momento poderia cair da linha, pois os amores andavam fracos, tristonhos até mesmo medonhos. Andava equilibrada, mas com muito medo, carregava na mão dois pesos de chumbo, às vezes gritava para sentir o bumbo do seu próprio coração. “Você está aí?”, gritava, e o velho não respondia, pois só o que conseguia era escrever o momento tão rico em argumentos, desalentos, descontentamentos, ventos. Os dedos se movimentavam quase na velocidade da luz, começava a aquecer, a iluminar, a gerar uma radiação amarela que nunca se pode copiar, mas ele escrevia atônito. Não queria parar. Preferia continuar. Era como goz... gostava muito disso tudo! Ângela caiu da linha, havia uma rede bem logo embaixo, rede de segurança, aquela que se faz quando se põe uma aliança. Ângela caiu balançou e sorriu. Aplaudiu o velho cansado que agora pela primeira vez descansava e gritava “É o fim do meu primeiro livro!” Ela caiu de alivio. Ela sussurrou se tinha feito tudo certinho. E ele a pegou pelos braços acanhado. Percebeu seus músculos do rosto que tanto havia reparado, agora poderia olhar sem anotar, só brilhar por dentro do olhos de velho escritor que nascia com quase noventa anos. A menina agora corria por outros planos, buscava outros velhos, outras dores de amor, ou quem sabe escrevê-las por si só. Seu Antônio percebeu ter alcançado seus objetivos, mas que agora tudo fazia mais sentido e talvez fosse a grande hora de voltar a florear suas dores e morrer. Morrer de amores.